São oito horas da manhã e Daniel já acordou acelerado. Mais um dia se inicia e em seu trabalho como de costume, o telefone toca dezenas de vezes por período; toda vez algo importante a decidir para o último minuto. Às nove horas já havia atendido umas oito ligações e então atendeu a pior do dia.Do outro lado uma voz formal lhe dizia: _ Seqüestrei sua filhinha Ana, você quer saber como resgatá-la?. Em altos brados Daniel gritou que era uma fraude; afinal, está virando moda este tipo de golpe e ele tinha certeza que Ana estava na escola. Calmamente o seqüestrador volta a se pronunciar: _ Acalme-se, certifique-se, não gosto de negociar com pessoas nervosas, volto a ligar em meia hora. Ah, esta roupinha florida que vocês compraram para ela é uma graça. Ele não queria acreditar no que tinha acabado de ouvir; sua mente dizia que era uma fraude, seu coração estava apertado e uma lágrima fugiu de seu rosto lentamente.Desesperado liga em casa e a confirmação. Sua mulher atende aos prantos e ele simplesmente não sabe o que fazer. Sua filha era o seu bem mais precioso e depois de uma gravidez problemática, sua mulher não poderia mais ter filhos. Não lhe saia da cabeça a imagem de uma menininha dócil de 4 anos pedindo para dormir com eles a noite por medo do escuro. Não lhe saia da cabeça o nível de perversidade de um ser humano. Nove e meia e o telefone voltou a tocar. Era o seqüestrador novamente e então ele perguntou: _ Você está disposto a negociar agora? Se você quiser posso ligar mais tarde, mas não gaste muito tempo. Daniel já havia perdido toda condição psicológica, ele tremia de tão nervoso, naquele momento seria capaz de matar e então o assassino desligou. Com sua influência deixou a policia e os bombeiros de sobre aviso, muito embora não soubesse se adiantaria ou não. Algumas horas se passaram e o seqüestrador não parecia ter pressa para negociar. Daniel tentou rastrear a ligação, mas, não obteve sucesso. Suas tentativas o levaram a um celular de chip. Ele estava embaixo do banco de uma praça, o telefone era clonado. Três horas da tarde o telefone tocou novamente.
_ E ai Daniel, achou o meu celular? Imaginei que o faria, vocês sempre pensam de maneira muito elementar.
_Quero negociar , quais são as suas condições, o quanto quer em dinheiro?
_ Não quero dinheiro, já tenho o bastante
_ O que você quer seu criminoso?
_ Será que só eu sou criminoso Daniel?
_ Diga logo o quer seu verme
_ Eu não trataria assim alguém que estivesse com minha filha.
Daniel não detinha o controle e nem condições para impor regras , então aos prantos pede para o seqüestrador “dar as cartas”.
_ Vamos logo, acabe esta tortura.
_ Não, mas, vou te dizer uma coisinha que pode te ajudar a achá-la .
_ Diga logo
_ Eu a enterrei viva dentro de um caixote com um galão de oxigênio.
_ Ela vai morrer
_ Ela vai ficar em pânico por não ver a luz, mas lá tem oxigênio até as oito horas da noite.
_ Desgraçado, nunca a acharei
_ Olhe só , ela está em um local público de bastante movimento em São Paulo. Boa Sorte.
_ Porque fez isto?
_ Quero que você padeça a angústia da morte. A beira da loucura e do desespero.
O tempo fechou em São Paulo e com chuva as coisas ficaram piores; parece que no desespero as horas passavam mais rápido. Daniel e sua esposa estavam em choque, a policia e os bombeiros perdidos em meio ao nada e então uma nova ligação:
_ São seis e meia, falta pouco e ela está no Ibirapuera.
Poderia ser uma fraude, contudo, eles não tinham mais tempo para discordar e buscar outros caminhos. Depois de muito esforço eles acharam o local, já era oito e meia, tarde demais. A mãe desceu ao inferno quando viu a suposta caixa e abraçada a um bombeiro chorou sem querer ver. Daniel parecia ter Parkinson e estava em um estado de desalento profundo. A policia abriu a caixa e não havia nada lá, apenas um bilhete: Jamais faria isto a uma criança, os inocentes são de Deus, mas, você pagará caro por seus atos. Conte a polícia o que você esconde há dez anos e naquele mesmo local, no mesmo dia, no mesmo horário, te devolverei Ana.Ele sabia que o passado havia voltado. Passou-se um mês, era então 12 de setembro , 17h , no Parque dos Tribais e ele disse a policia que revelaria seu segredo assim que estivesse com Ana nos braços. O seqüestrador fez o que prometeu e levou Ana sem um arranhão, ela estava feliz como se estivesse voltado de férias, sem marcas de violência ou traumas. O local estava tomado pela população, o caso tinha ganho grandes proporções e ali o seqüestrador conheceria as pessoas que estariam em seu júri popular. A policia estava desconcertada e não conseguia entender o que estava acontecendo. Antes de ser preso a história muda de figura quando o seqüestrador entrega fotos a policia e Daniel se vê abrindo o seu passado. Com lágrimas nos olhos ele confessa que naquelas mesmas condições anos atrás , atropelou o filhinho de um fotografo e por ter medo de ser preso, nem sequer parou para ajudar; foi inconseqüente , foi fraco e covarde. O seqüestrador chorando contou os outros detalhes:
_ Meu filho padeceu em meus braços e desci ao inferno várias vezes. Convivi com o vazio, com o medo, com a solidão, com a angústia. A mãe dele não agüentou a perda e se jogou do alto de um prédio. Não me falem de justiça. Não para um pai de coração partido que convive há anos com esta dor como se fosse um pesadelo. Algumas pessoas choraram ao ouvir a história e as fotos eram fortes demais. Ambos foram processados e presos por motivos diferentes; entretanto, uma questão permanece viva: O que você faria por amor? Existe um limite? Quem deveria pagar mais caro?.
Dam Nascimento